sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Atrás da porta

Atrás da porta

                A menininha olha para a porta que se fechou. “Onde está a mamãe? Ela sumiu atrás da porta.”
                A menininha chora. Ela tem vontade de sair pela porta.  Mas a moça não deixa. A moça diz:
                _ Pare de chorar, menininha. Vamos brincar com os coleguinhas!
                A menininha não quer brincar. Ela quer a mamãe, que ficou atrás da porta. A porta está trancada. Foi a moça malvada quem trancou. Como ela tem coragem?  Ela não tem pena da menininha?
                Sim, a moça tem pena da menininha. Queria deixar a menininha passear pelos campos de mãos dadas com a mãe. Mas não pode. O tempo de passeio acabou. Tão cedo? A menininha ainda é tão pequena. Só está começando a vida.
                Mas é cedo que a menininha tem que aprender que, às vezes, temos que ficar atrás da porta que se trancou, para construirmos o nosso futuro. A moça sabe disso, mas a menininha não sabe ainda. Então ela chora e chora. A moça senta com ela atrás da porta e espera também.
                Os dias passam e a menininha continua chorando. E a moça ainda está sentada atrás da porta com ela, esperando que ela pare de chorar.
                Finalmente a menininha para de chorar e ela e a moça percebem que agora podem começar a construir um futuro juntas.
                O sol passa a brilhar, as flores desabrocham e a menininha aprende coisas novas com os coleguinhas e a moça. A menininha já não acha mais que a moça é malvada. Ela brinca com as crianças. E o melhor de tudo: a moça entende e sabe falar o “meninês”.
                A menininha cresce um pouquinho e vai embora. O tempo passa e a moça também vai embora.
                Muito tempo se passa. A menininha vira moça e a moça vira senhora. Então, menininha (agora moça) e moça (agora senhora) se encontram novamente. E a menininha (agora moça)  descobre que a moça (agora senhora) continua trancando portas, só que para moças.
                As moças tem que aprender que, às vezes,  temos que trancar algumas portas, para podermos construir um futuro. Mas as moças não entendem isso. Então a senhora se pergunta quanto tempo ainda terá que ser malvada e continuar trancando portas para menininhas e moças.
                A senhora não chora, mas fica muito triste. Ela já não tem certeza se ainda consegue fazer o sol brilhar, as flores desabrocharem e nem que as moças aprendam com ela e os coleguinhas. Ela olha pra porta e sente vontade de passar por ela, como tinha vontade a menininha . Mas a senhora não pode passar, porque a porta está trancada.
                Então alguém lhe diz que lhe deixaram uma carta. De quem será? Quando começa a ler, ela vai percebendo que a carta é da menininha.  Ela diz que se lembra da senhora ter ficado com ela atrás da porta, enquanto chorava, ainda muito pequena. A menininha lhe agradece por ter trancado a porta.
                A senhora fica feliz de novo e agradece a menininha por ter deixado aberta a porta do seu coração e acha que ainda pode ver o sol brilhar, as flores desabrocharem  e continuar ensinado e aprendendo coisas novas com as moças.
                Mas isso dura pouco tempo. Porque o céu começa a escurecer, o vento passa a soprar e a senhora olha de novo para a porta. A senhora tenta sair, mas a porta continua trancada. A senhora senta e chora atrás da porta. Os amigos da senhora sentam junto com ela atrás da porta. Eles dizem:
_ Pare de chorar, senhora. Vamos conversar com os colegas!
A senhora não quer conversar. Ela quer ir para casa. A porta está trancada e ela continua chorando. Ela olha para o quadro e se desespera. Ela já não é capaz de traduzir uma única palavra do “meninês”. Então a senhora se levanta, destranca a porta e vai embora.
O tempo passa e a senhora volta. Mas o sol já não brilha e as flores estão murchas. A porta continua trancada para a senhora e para as moças.  A senhora entende que temos que trancar algumas portas, para podermos garantir o futuro. Mas ela já não sabe se vale a pena ser malvada e continuar trancando portas para menininhas e moças. E o pior de tudo: a senhora tem que continuar, mesmo sabendo que já não entende e nem sabe falar o “meninês”.

FIM

 Rose Amaral

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